03 de junho de 2025
GAZETILHA

Um mundo cada vez mais ridículo 5w1f3u

Por Corrêa Neves Jr. |Editor do GCN/Sampi
| Tempo de leitura: 6 min

"O verdadeiro inimigo não é o poder, mas a estupidez" 5q5w40

George Orwell, escritor e jornalista britânico

Muitos escritores, filósofos e cientistas se debruçaram, nos últimos séculos, em incontáveis horas de trabalho, usando o melhor de suas capacidades e conhecimentos para traduzir em palavras suas visões para o futuro da humanidade.

Os ficcionistas, quase sempre, trouxeram uma perspectiva pessimista, marcada pela ideia de uma sociedade altamente tecnológica, mas também absolutamente controlada e estratificada, onde características como criatividade, livre-arbítrio, pensamento não convencional, misericórdia e compaixão acabariam sacrificadas em nome do “bem comum”.

Obras como “1984”, de George Orwell, e “irável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, são clássicos que tratam exatamente desse tema com uma perspectiva para lá de sombria.

Ainda que tenham sido amargos, céticos e não tenham economizado na desilusão com a qual arriscaram suas previsões para o que o futuro nos reservaria, nenhum deles acertou num ponto: a acelerada imbecilização da humanidade, consequência de um combo que reúne infantilização e ignorância com uma pitada generosa de falta de vergonha na cara. O que temos vivido transcende qualquer exercício de ficção. Parece piada, mas não é.

Tome-se como bom exemplo a enorme confusão que cerca alguns humanos que aram a se identificar como... animais. Tem gente que não apenas quer ser tratada como animal, mas diz que quer viver, na maioria das vezes, como se fosse um. Homens e mulheres que querem ser vistos como cachorro, gato, cervo, leopardo, cavalo e até... girafa.

O grupo tem nome, categoria própria. São chamados de “therians” e se definem como pessoas que acreditam possuir uma “profunda conexão espiritual, psicológica e metafísica” com determinado animal.

Suprema imbecilidade, há até campeonato de adestramento para humanos que se sentem animais. É patético, no nível máximo. Adestradores e seus “animais” (humanos, teoricamente) desfilando numa pista, fingindo de morto, “empinando” as patas (braços), e por aí vai... Tem até competição de saltos de therians, com humanos lançando-se sobre obstáculos, imaginando-se cavalos e éguas. Tá duvidando de mim? Pesquise o International Puppy and Trainer Contest, realizado anualmente em Chicago, nos Estados Unidos, e tente não rir – ou morrer de vergonha alheia.

Neste mundo marcado por tantas fragilidades, nem seria de se espantar que parte dos psicólogos tenha estendido a “adolescência” até os 24 anos. Sim, é isso mesmo. Adolescente hoje em dia não é mais o garoto ou a menina que experimentam explosões hormonais numa fase tão bonita quanto complicada da vida. Tecnicamente, foi “expandida” até muito depois dos 20 anos.

Também é cada vez mais comum “jovens” de 30 anos em busca do primeiro emprego, sem terem feito nada de relevante na vida até este ponto, ou quarentões que seguem morando na casa dos pais, com as contas pagas por eles, sem rumo nem objetivo, numa etapa em que já deveriam ter carreiras consolidadas e uma história para contar.

Não estão de volta à casa dos pais porque saíram de algum divórcio complicado, nem porque precisam cuidar dos mais velhos, mas simplesmente porque, em plena maturidade, ainda não tiveram a decência de assumir as rédeas da própria existência. Vagueiam, como se a vida fosse uma grande brincadeira, sem demonstrar quaisquer sinais de orgulho próprio nem coragem para coisa alguma.

Por mais bizarro que tudo isso possa ser, nada se compara, para mim, à mais recente manifestação de imbecilidade: a saga dos bebês “reborn”.

Já começa pelo nome, porque o tal “reborn” nada mais é do que uma boneca ou boneco, com a diferença de que são hiper-realistas. Sofisticação à parte, do mesmo jeito que as antigas bonecas de pano, de pau, de plástico, bebês “reborn” não são gerados a partir do encontro de esperma com óvulo, não “nascem” de uma barriga, não crescem, não têm coração, fígado, rins, pulmões, consciência ou alma — qualquer que seja a definição que se queira aplicar a esta última.

Ter adultos brincando de boneca, não como colecionadores, mas do jeito que crianças fazem, já seria preocupante. Mas vê-los levar a diversão à condição de paternidade ou maternidade beira a loucura — se já não for a própria.

Já há, no Brasil, registros de “pais” de bebês reborn brigando na Justiça pela “guarda” do brinquedo, exigindo divisão de tempo da “criança” entre as casas, como se fosse um filho. Há “mãe” levando o boneco para ser atendido no SUS, numa UBS, porque o bebê “teve febre” à noite, e querendo ingressar na Justiça para garantir vaga na creche.

Festas de aniversário para bebês reborn têm sido promovidas. Gente, de carne, osso e cérebro, começa a falar em estender os benefícios da licença-maternidade para “mães” de reborn, como se tivessem em casa uma criança que demanda atenção. Há quem teorize sobre a extensão de outros benefícios, como licença médica, para famílias que tenham um “reborn” entre os seus. Dá para acreditar?

Se duvida, basta olhar o perfil do prefeito tiktoker de Sorocaba, Rodrigo Manga que, na falta do que fazer — e aparentemente sem grande disposição para enfrentar como homem as pesadas denúncias de corrupção que pesam contra si — resolveu promover, num parque da cidade, um dia de atividades para famílias com bebês reborn, com direito a “certidão de nascimento” e “carteirinha de vacinação”. Não, você não leu errado nem isso é uma piada.

Num mundo marcado por tanta violência, injustiças, guerras, conflitos diversos, intolerância religiosa, doenças e problemas reais, olhar para estas questões convertidas em “dramas” por uma parcela de humanos incapazes de ter dimensão da complexidade — e também da beleza — da nossa existência, é de causar desespero.

Não sou psicólogo, nem tenho pretensão de ser, mas tenho a mais absoluta convicção de que a solução para tudo isso é bem prática.

Os “pais” de bebês reborn deveriam ser obrigados a fazer trabalho social numa creche, já que tanto querem cuidar de bebês. Os “therians” poderiam ter destino semelhante e ser levados a cuidar de animais de rua ou prestar assistência em abrigos, onde há seres vivos que precisam de ajuda real.

No caso dos adolescentes tardios ou quarentões encostados, a solução é ainda mais simples: uma enxada e um alqueire de pasto para carpir, numa frente de trabalho de alguma prefeitura, produziriam milagres.

Se você discorda de mim, faz parte. Mas, neste caso, sugiro que procure um psicólogo ou psiquiatra. Normatizar tudo isso não é avanço. É, simplesmente, renunciar à nossa condição de animais racionais e acelerar nossa própria autodestruição enquanto espécie. Tudo isso acima pode ser muita coisa. Mas normal, não é.

Corrêa Neves Jr é jornalista, diretor do portal GCN, da rádio Difusora de Franca e CEO da rede Sampi de Portais de Notícias. Este artigo é publicado simultaneamente em toda a rede Sampi, nos portais de Araçatuba (Folha da Região), Bauru (JCNet), Campinas (Sampi Campinas), Franca (GCN), Jundiaí (JJ), Piracicaba (JP) e Vale do Paraíba (OVALE).