EDUCAÇÃO

Mantenedora da Univap, FVE registra déficit de R$ 995 mil em SJC

Por Xandu Alves | São José dos Campos
| Tempo de leitura: 8 min
Repórter especial
Divulgação
Campus Urbanova da Univap, na região oeste de São José dos Campos
Campus Urbanova da Univap, na região oeste de São José dos Campos

Dois anos após registrar um superávit de R$ 38,3 milhões, a FVE (Fundação Valeparaibana de Ensino) encerrou 2024 com déficit de R$ 995 mil em suas finanças, de acordo com balanço divulgado pela instituição. A fundação é mantenedora da Univap (Universidade do Vale do Paraíba), dos Colégios Univap e do Parque Tecnológico Univap.

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Próximo a R$ 1 milhão, o déficit de 2024 ocorre após uma sequência de resultados positivos. Em 2023, o superávit foi de R$ 1,92 milhão, enquanto, em 2022, atingiu um saldo positivo de R$ 38,3 milhões. Entre 2022 e 2024, a FVE despencou de R$ 38,3 milhões de superávit para R$ 995 mil de déficit, de acordo com os balanços.

Em 2021, a instituição teve superávit de R$ 734 mil. Mesmo no ápice da pandemia do novo coronavírus, a FVE havia ficado no azul, sem registro de déficits.

A OVALE, a FVE afirmou que "é uma instituição sem fins lucrativos", que busca o "equilíbrio financeiro" e ainda classificou como "insignificante" o déficit registrado em 2024 (veja resposta completa mais abaixo). Profissionais ligados à fundação cobram "mais transparência" (leia mais abaixo).

O desmoronamento nas finanças em 2024 ocorreu mesmo com aumento na quantidade de alunos matriculados na instituição nos últimos anos, segundo a FVE.

Os dados mostram que o número de alunos de 2020 (6.508) caiu para 6.043 em 2021, com uma retomada nos anos seguintes: 6.069 em 2022, 6.208 em 2023 e 6.378 em 2024.

A instituição informou que o ano de 2024 foi “marcado pela continuidade do processo de recuperação no número de alunos, atingindo 98% do total registrado em 2020”.

A recuperação, acrescentou a FVE, “consolida a trajetória de crescimento iniciada em 2023, após as perdas significativas observadas em 2021, em decorrência da pandemia e de seus efeitos prolongados”.

Recuperação.

Para avaliar a situação da instituição, OVALE conversou com membros da comunidade escolar da Univap, com professores e ex-professores e participantes de conselhos institucionais, pessoas ligadas à direção. Todos aceitaram falar com a reportagem na condição de anonimato.

A percepção geral é de que a instituição enfrenta desafios econômicos após a pandemia, que impactou severamente as unidades de ensino no país, e que precisa encontrar meios de manter a operação sem sobrecarregar as finanças a ponto de colocar a universidade em risco. Além disso, há educadores que cobram mais transparência e profundidade nas apresentações dos balanços financeiros.

“Uma coisa ruim na apresentação desses resultados [de 2024] foi a falta de explicação. Não se abriu no conselho as discussões sobre esse assunto, sobre esse balanço. Não foi discutido. Simplesmente ele foi apresentado, mas não foi explicado”, disse uma fonte a OVALE.

De acordo com a FVE, os membros dos conselhos institucionais recebem, com antecedência, relatórios aprofundados sobre os balanços financeiros, que são mais extensos do que os próprios balanços.

A fonte confirmou o recebimento desses relatórios, mas disse que as explicações deveriam ser apresentadas nas reuniões de forma mais aprofundada. “Nós recebemos com antecedência [o relatório], mas isso não foi apresentado, a questão financeira, não foi apresentada e discutida no contexto do conselho”, afirmou à reportagem.

Qualidade.

Uma das fontes ressaltou a OVALE que é preciso debater as saídas que a instituição precisa ter para manter a qualidade educacional e o patrimônio conquistado ao longo de décadas. Nesse último período, a universidade gastou mais com demissão de professores com doutorado, segundo a fonte, por questões pedagógicas e acadêmicas. Tais medidas elevaram os gastos e impactaram negativamente no balanço financeiro.

“Ano ado, houve a demissão de alguns professores, inclusive professores antigos, que foram demitidos por meio de acordo. Eles pediram para sair. Pessoal com mais de 30 anos de instituição. Consequentemente, mesmo fazendo acordo, isso acabou gerando realmente um déficit institucional bem significativo”, afirmou.

Outro educador ouvido por OVALE, que deixou a Univap, disse que é preciso dar mais transparência à gestão da universidade. Ela cobra explicações mais claras para a comunidade acadêmica, além de apontar o risco de a Univap tentar seguir o caminho de faculdades com apelo mais popular, com cursos mais baratos, mas de baixa qualidade.

“É perigoso sucatear os profissionais e cortar verbas para pesquisa, doutores e mestres. Não adianta pegar professor barato e colocar mais aluno em sala de aula. Não dá para comparar a Univap com as outras [faculdades] em termos de preço, nem de qualidade, mas vejo a mesma estratégia dessas de mercado”, disse a fonte.

Avaliação de ensino.

Segundo os dados do MEC (Ministério da Educação), a Univap vem mantendo nota 3 do IGC (Índice Geral de Cursos). O índice não caiu, mas também não subiu. O IGC é um indicador que avalia a qualidade dos cursos de graduação e pós-graduação da instituição, em uma escala de 1 a 5.

Já o CI (Conceito Institucional) da Univap tem nota 5, que é o valor máximo. Os dados são de 2023, os mais atuais do MEC. A universidade ainda tem nota máxima (5) do MEC nos cursos de Produção Audiovisual, História, Engenharia Mecânica, Ciências Biológicas (licenciatura) e Publicidade e Propaganda.

No RUF (Ranking Universitário Folha), uma avaliação anual do ensino superior do Brasil feita pelo jornal Folha de S.Paulo desde 2012, a Univap aparece como a 133ª melhor universidade do país.

Os dados são de 2024 e foram avaliadas 203 instituições públicas e privadas, a partir de cinco indicadores: pesquisa, internacionalização, inovação, ensino e mercado.

A nota geral da Univap foi 37,61, de 100 possível. A universidade recebeu nota 21 em pesquisa (de 0 a 42, na 95ª posição), 7,73 em ensino (0 a 32 / 166ª), 3,96 de mercado (0 a 18 / 157ª), 2,96 de internacionalização (0 a 4 / 50ª) e 1,94 de inovação (0 a 4 / 65ª).

O ranking é liderado por universidades públicas, federais e estaduais, como a USP (Universidade de São Paulo), a Unicamp (Universidade Estadual Paulista) e a UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

A universidade privada mais bem ranqueada é a PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio Grande do Sul, na 22ª colocação.

Outro lado.

À reportagem de OVALE, a FVE informou que todos os resultados financeiros são “auditados por empresas independentes e especializadas e aprovados pelos conselhos da FVE”, que são compostos por membros internos e representantes da comunidade.

Os balanços financeiros, de acordo com a FVE, são “devidamente protocolados e avaliados pela Curadora de Fundações do Ministério Público do Estado de São Paulo, órgão responsável pela fiscalização das fundações”.

Em nota, a FVE informou que é uma instituição sem fins lucrativos e que todas as receitas devem ser “integralmente reinvestidas em suas finalidades institucionais”, que são "Educação, Pesquisa, Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento, Inovação Científico-Tecnológica e interação com a comunidade por meio da Extensão".

“O objetivo institucional da Fundação não está pautado na geração de lucro ou superávit, mas sim na ampliação e no aprimoramento contínuo de sua missão educacional e social”, diz a nota.

Em virtude dessa natureza, a FVE informou que “não se espera a obtenção de grandes superávits, mas sim resultados próximos ao equilíbrio financeiro”.

E explicou: “No exercício de 2023, foi apurado um superávit da ordem de 1% da receita bruta, enquanto em 2024 se observou um déficit de aproximadamente 0,6%, evidenciando o equilíbrio financeiro buscado”.

“Ressalta-se que, no exercício de 2022, a Fundação registrou um superávit significativamente superior à média histórica, decorrente da alienação de ativos inoperantes, cuja venda foi aprovada pelos conselhos institucionais, permitindo a destinação dos recursos obtidos ao fortalecimento de suas atividades fim”, afirmou a FVE.

Em 2024, a Fundação disse que também foram feitos investimentos em infraestrutura nas unidades mantidas, com reforma de salas e espaços, aquisição de microcomputadores para a montagem e atualização de laboratórios, além da aquisição de 710 carteiras para substituição nos colégios de educação básica, parte do total de 2.310 carteiras substituídas, cuja troca se iniciou em 2023.

Ações.

A entidade afirmou que vem implementando ações junto à comunidade com o objetivo de “mitigar esses efeitos adversos”. “Tais iniciativas visam assegurar a continuidade e o fortalecimento do compromisso da Fundação com a oferta de educação e atendimento de qualidade”.

A FVE informou ainda que foram concedidos aproximadamente R$ 56 milhões em bolsas e descontos concedidos ao alunado da Fundação, que correspondem a 32% do faturamento bruto, “reforçando a insignificância do déficit de 995 mil reais no resultado final do exercício, que corresponde a 0,6% do faturamento bruto”.

Os descontos e bolsas foram concedidos por estar a FVE "sensível aos impactos negativos provocados pela pandemia", com a queda de renda da população, motivando "ações junto à comunidade com o objetivo de mitigar esses efeitos adversos". "Tais iniciativas visam assegurar a continuidade e o fortalecimento do compromisso da Fundação com a oferta de educação e atendimento de qualidade", afirmou.

Expectativa.

Sobre a expectativa do resultado financeiro em 2025, a FVE disse que “muitos investimentos executados em 2024 para atender a quantidade enorme de ações” não ocorrerão em 2025.

“Como exemplo temos gastos em reestruturação, treinamentos, lançamentos de novos cursos, implantação da modalidade a distância, etc. o que abrirá espaço para novos projetos e manutenção do equilíbrio financeiro. Espera-se, contudo, a continuidade do crescimento do alunado, o que restará por representar crescimento na Receita, possibilitando à FVE novos investimentos nas suas atividades fim”, informou.

“A Fundação tem implementado uma série de iniciativas estratégicas voltadas à sua sustentabilidade e perpetuidade institucional. Entre essas ações, destacam-se os programas de captação de alunos, a otimização do uso de ativos, o aumento da efetividade na arrecadação de receitas, o programa ‘Sugestões da Comunidade Interna’ e a adoção de medidas de austeridade no controle das despesas, entre outras”, explicou.

Sem resposta.

OVALE ainda enviou questões adicionais à FVE, mas que não foram respondidas. O espaço segue aberto caso a Fundação queira respondê-las. Entre as questões estavam: Quais foram os imóveis vendidos em 2022 e por quais valores? Como esses valores foram investidos? Por que a FVE considera “insignificante” o déficit apontado no balanço de 2024? 

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