Sabe, é curioso como o tempo tem esse jeito silencioso e certeiro de nos ensinar aquilo que antes apenas observávamos nos outros. Estou agora com 44 anos e, para alguns, ainda sou considerado um garoto. Mas, em 2005, já iniciava minha primeira pós-graduação em Geriatria e Gerontologia pela UERJ, movido pelo desejo de cuidar das pessoas no seu processo de envelhecimento. Hoje, com mais vivência e introspecção, sinto que esse envelhecer começa a me visitar também. De maneira mais suave, é verdade, mas inegavelmente presente. 4y413k
E é justamente nesse lugar, entre o estudo e a experiência, que começa uma nova forma de compreender a velhice. Além da minha própria jornada, quero compartilhar a história de outras pessoas que também dedicaram suas vidas ao tema e, agora, vivem na pele o que antes apenas ensinavam.
Comecemos com Robyn Golden, 67 anos, assistente social reconhecida por seu conhecimento e firmeza ao lidar com as questões do envelhecimento. Por décadas, aconselhou pessoas com segurança, orientando sobre as dores, medos e limitações dessa fase da vida.
Mas hoje, ela mesma se vê tropeçando, com ternura, nas dificuldades que antes explicava com tanta clareza. E é bonito de ver porque só quando se está do lado de dentro é que se compreende o verdadeiro peso, e também a delicadeza, do envelhecer.
Certa vez, Robyn decidiu jogar pickleball, um jogo de raquetes que vem ganhando espaço no Brasil, inclusive em Piracicaba. Mas a história não é sobre esportes é sobre expectativas. Ela achou que, com dedicação, poderia acompanhar o ritmo dos mais jovens. Não foi bem assim. A comparação doeu, o impulso de desistir apareceu. Até que uma conversa com alguém querido a fez enxergar o óbvio: ela tinha 30 anos a mais que seus colegas de quadra. Às vezes, é preciso um espelho amigo para nos lembrar de sermos gentis conosco. Hoje, Robyn continua jogando, toda semana. Não pelo desempenho, mas pelo prazer. E isso muda tudo
Assim como ela, muitos especialistas estão redesenhando aquilo que sempre ensinaram. Porque viver o que se prega é sempre uma nova camada de aprendizado.
Não se trata apenas de manter-se ativo, mas de manter-se curioso, disposto a continuar. Veja Katharine Esty, psicóloga de 90 anos. Mesmo após décadas de escuta e orientação, ainda confessa o medo de desacelerar. Foi ouvindo outros octogenários que descobriu algo poderoso: um projeto apaixonante pode ser o melhor antídoto contra a solidão e o vazio. Aposentar-se, afinal, não precisa ser o fim de nada pode ser o início de tudo.
E não são poucos os que descobrem novos talentos ou desejos nessa fase. Ensinar, bordar, correr, escrever, fotografar, recomeçar. É como se o tempo, que antes nos empurrava para a produtividade, agora dissesse em tom sereno: “vai, só pelo prazer”. E a ciência reforça esse chamado. Quem se envolve, vive mais. E melhor.
Bruce Leff, médico de 63 anos, estudou o envelhecimento por toda a vida. Agora, ao vivê-lo, percebe que talvez o mais importante não seja a resiliência palavra que, para ele, carrega um peso de resistência. O que ele valoriza hoje é a adaptabilidade: aquela capacidade de aceitar que algo mudou e tudo bem. Porque o corpo muda. As perdas chegam. Mas as histórias de quem segue com propósito continuam sendo contadas. E são reais.
Já Ellen Langer, psicóloga de Harvard, com seus 78 anos, prefere não pensar na idade. E talvez, por isso mesmo, nem a sinta. Seus estudos mostram que viver com leveza, presença e curiosidade pode melhorar até a saúde física. O corpo escuta o que a mente acredita. É como naquela frase tão repetida quanto verdadeira: “Velho é o corpo, não a alma”.
Michael Schuchert, personal trainer de 54 anos, também vive essa transição. Hoje, treina pessoas que querem continuar pegando os netos no colo, subindo escadas, dançando sem medo. Objetivos simples, mas imensos. Ele aprendeu que força, agora, vem acompanhada de paciência. O tempo ensina que tudo bem andar mais devagar desde que a gente continue indo.
Robyn Golden, aquela mesma do começo, mudou sua visão sobre moradias compartilhadas. Antes, soavam frias, impessoais. Hoje, parecem acolhedoras. Já escrevi sobre isso aqui no Jornal de Piracicaba: o que serão as “casas de repouso” para a nossa geração? A resposta está sendo construída, com mais afeto e menos preconceito. A vida nos molda devagar, e o que parecia distante a a fazer sentido.
Ela quer aprender coisas novas. Talvez música. Talvez cartas. Talvez nenhuma delas. E tudo bem. Porque envelhecer é isso: é desapegar do que se esperava ser, é abrir espaço para o novo — mesmo que ele venha devagar. É aceitar que tudo muda, mas que a potência de viver permanece.
Seja no jogo, no trabalho, no aprendizado ou nos afetos, o envelhecimento não precisa ser um fim. Pode ser uma bela continuação.
Rogério Cardoso é personal trainer e preparador físico, membro da Sociedade Brasileira de Personal Trainer SBPT e da World Top Trainers WTTC.