OPINIÃO

Um papa progressista, mas equilibrado

Por Zarcillo Barbosa |
| Tempo de leitura: 3 min
O autor é jornalista e articulista do JC

Bom sinal a eleição relativamente rápida do novo papa. Bastaram menos de dois dias e quatro escrutínios para que os cardeais chegassem ao consenso. Depois do "habemus papam", surpreendeu o nome do iluminado pelo Espírito Santo. Robert Francis Prevost, 69 anos, nasceu em Chicago, mas é cidadão peruano naturalizado. Temos um papa americano-latino, o que pode significar - presságio positivo.

A escolha do nome, Papa Leão XIV, também justifica otimismo. Com certeza, o novo chefe da Igreja Católica se inspirou em Leão XIII, papa entre 1878 e 1903, um conciliador. Sua encíclica Rerum Novarum (1891) se constitui, ainda hoje, no documento base do pensamento social da Igreja. À época de Leão XIII, representou a renovação fundamental da participação dos católicos no movimento operário. A Revolução Industrial deu nascimento ao "capitalismo selvagem", explorado por Karl Marx. Leão XIII também chamou a atenção do mundo para a exploração "do homem pelo homem", e o direito dos operários de se organizarem para, unidos, exigirem condições humanas de trabalho.

O Papa Leão I, foi aquele que conseguiu o milagre de deter a horda de Átila às portas de Roma, prestes a ser invadida e saqueada. Até hoje não se sabe o que o papa disse para Átila desistir de tomar a cidade incapaz de se defender. Leão I convenceu o rei dos Hunos, chamado "O Flagelo de Deus", a dar a volta com seus exércitos e deixar os romanos em paz, sob suas bênçãos.

Os especialistas justificam a escolha de Robert Francis Prevost por representar uma alternativa equilibrada entre os pontificáveis. Dizem os vaticanistas que ele configura o equilíbrio entre a agenda inclusiva de Francisco, e o retorno ao caminho doutrinário dos conservadores. O novo papa deixou claro, enquanto bispo e depois cardeal, seu compromisso com os pobres e imigrantes. Em redes sociais, já havia criticado a política de expulsões compulsórias do presidente Donald Trump e do seu vice.

Com toda certeza irá continuar o trabalho iniciado pelo antecessor, de disseminar entre o clero a necessidade de ir ao encontro das pessoas, aonde estiverem. Como pregava Francisco, não é só com palavras, mas com atos, é que a Igreja se mostra verdadeiramente solidária. "Caminhar com ele, sofrer com ele", é a frase síntese que já era empregada por Prevost, enquanto bispo da Diocese de Chiclayo, no Peru, até o ano ado.

A grande dúvida é se Leão XIV irá prosseguir nos esforços de Francisco para "desmasculinizar" a Igreja, conforme as próprias palavras do recém-falecido. No Vaticano, as mulheres só puderam assistir pela fresta da pesada porta a movimentação dos cardeais e o anúncio final depois da fumaça branca. Nos 12 anos de pontificado o papa argentino conseguiu notáveis avanços na inclusão de mulheres na estrutura da Igreja. Várias foram nomeadas para postos equivalentes a de ministras de Estado. Aumentou de 19% para 23% o número de trabalhadoras na Santa Sé. Essas atitudes geraram controvérsias por parecerem progressistas demais para uns, e cautelosas demais para outros.

A Carta Apostólica Spiritus Domini, de 2021, permite às mulheres a leitura da Bíblia durante a missa e distribuir comunhão aos fiéis. Parece que tudo foi feito para esfriar a questão mais delicada, a ordenação de mulheres. Pelo Direito Canônico, elas estão proibidas de ar ao sacerdócio. As ordens sagradas são reservadas aos homens. Francisco permitiu estudos sobre a possibilidade do diaconato feminino, o que está longe de ser a mesma coisa. As mulheres seriam consideradas como do clero, mas com a função de ajudar e servir ao povo de Deus, sob obediência de padres e bispos.

Abrir as portas, de vez, para as mulheres, seria o mesmo que mudar a estrutura do poder simbólico dentro da igreja, que é masculina e patriarcal por essência. A justificativa estaria na Bíblia. Jesus acolheu apenas homens como apóstolos. A Igreja não tem autoridade para mudar.

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