OPINIÃO

Dois grupos da CBF e o futuro novo presidente


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O "torcedor de futebol comum" está acompanhando toda essa confusão sobre a presidência da CBF, e boa parte não está entendendo nada. Mas, afinal, quem são os candidatos? Ou melhor: quem está querendo assumir o poder?

Para entender, há dois grupos políticos rivais:

1 - O de Ricardo Teixeira e Marco Polo Del Nero, que antigamente eram rivais, mas se uniram nos anos 2000 e geraram dirigentes como Caboclo e Cel Nunes (que nunca foram autônomos, mas sim peças comandadas) ou ressuscitaram outros, como José Maria Marin.

2- O de Reinaldo Carneiro Bastos, que fomentou Ednaldo Rodrigues e que, à boca pequena, sabidamente mandava no futebol brasileiro até então, em um comportamento igual ao grupo anterior: um presidente eleito, como foi Ednaldo, sem autonomia, supostamente comandado por alguém superior.

Tudo começou tempos atrás, quando Eduardo José Farah se licenciou da FPF e houve um acordo para que Reinaldo Carneiro e Marco Polo assumissem a entidade (como presidente e vice, respectivamente). Na hora H, Marco Polo assumiu a presidência alegando ser o vice mais velho e quebrando o combinado, gerando uma guerra de poder. Entre idas e vindas judiciais, houve o caso “Madonna”, onde Marco Polo Del Nero denunciou à CBF que a partida que poderia decidir o título do Brasileirão, Goiás x São Paulo, estaria moralmente comprometida pois Reinaldo Carneiro Bastos houvera pedido ingressos à diretoria Tricolor para assistir ao show da cantora Madonna no Morumbi, e que o “Pinguim” (árbitro Wagner Tardelli, escalado para o jogo) seria um dos vips que receberam ingresso de Reinaldo.

Enfim: tudo isso alimentou as disputas de poder, levando Marco Polo a compor com Ricardo Teixeira. Mas... tudo isso explodiu com o Fifagate (a ação da Interpool que prendeu e/ou suspendeu cartolas de futebol em escândalos envolvendo direitos de transmissão e Copa do Mundo, por corrupção).

Com dirigentes banidos e alguns presos, algumas lacunas surgiram e os diversos vice-presidentes da CBF tentaram ser protagonistas. Mas sem o apoio dos poderosos cartolas aqui elencados, nada seria possível. Até porque os clubes têm medo desses nomes e nada podem fazer.

Surgiu então Ednaldo Rodrigues. E como ele se manteve no poder até então?

Com o apoio de Reinaldo, o baiano teve decisões judiciais a seu favor e s de dirigentes que o garantiam no poder. Além disso, o jogo político foi forte: escudos da FIFA a árbitros e bandeiras por interesses nem sempre meritocráticos (vide, especialmente no quadro feminino, o número de oficiais desconhecidas de estados não tão representativos do futebol, com a insígnia internacional). Fora isso, o óbvio: a barganha financeira.

Na última eleição da CBF, o presidente Ednaldo Rodrigues (do grupo de Reinaldo) foi aclamado por unanimidade pelos clubes e federações, sendo inviabilizada a chapa adversária, do grupo de Teixeira e Marco Polo, que tentou lançar Ronaldo Nazário.

Entenda: para concorrer, cada candidato precisa ter apoio declarado por 8 federações e 5 clubes. Ronaldo não conseguiu apoiadores. E nesse processo questionável, o colégio eleitoral é formado pelas 27 federações com peso 3 no voto, pelos 20 clubes da Série A com peso 2 e pelos 20 clubes da série B com peso 1. Ou seja: se as Federações fecharem com algum candidato, não adianta todos os outros clubes se unirem para votar em outro, pois a força deles é menor. Assim, perceba: Federações como a do Amapá ou da Rondônia tem mais força e “importância” do que clubes como Flamengo ou Corinthians.

No pleito ocorrido há pouco dias, estourou o escândalo de que os presidentes de Federações tiveram uma benesse de Ednaldo Rodrigues, onde eles recebiam aproximados 50 mil reais e tiveram um reajuste para R$ 215 mil, com direito a “16º salário” (entre aspas, pois não é salário propriamente dito, mas são 16 parcelas anuais desse valor). Por unanimidade, o grupo de Reinaldo continuou no poder.
A questão é: com a decisão judicial que retirou Ednaldo do poder, pois a do Cel. Nunes que o garantiu no poder (no primeiro processo do imbróglio) houvera sido falsificada. Ato contínuo, Fernando Sarney (filho de José Sarney, um dos 8 vices da CBF e ligado ao grupo de Teixeira e Marco Polo, assumiu o poder para convocar eleições.

As chapas tiveram 4 dias para registro de candidatura, e a oposição atual a Ednaldo (entenda-se: grupo de Teixeira e Marco Polo) lançou Samir Xaud. A situação, sem nome, lançou o próprio nome de Reinaldo Carneiro Bastos.

Entretanto... Reinaldo não conseguiu ter o apoio de 8 federações (somente a sua própria federação, a Paulista, além da do Mato Grosso, o apoiaram). Assim, troca-se de grupo político no poder no dia 25, dia das Eleições na CBF e que terá candidato único (véspera da apresentação de Carlo Ancelotti como treinador da Seleção Brasileira e convocação para as Eliminatórias).

E por que Reinaldo “não vingou”?

Ora, pelo motivo óbvio: os presidentes de federações querem vantagens e não são fieis a nomes. O grupo representado por Ednaldo instituiu o mensalinho, aumentou o salário deles e criou o 16º. Não tinha mais nada a oferecer. Já o outro grupo, sedento ao poder, pode oferecer outros tantos benefícios.

Alguém pode questionar: mas eles não elegeram Ednaldo recentemente por unanimidade? E a resposta é: “sim, mas as federações enxergam outras oportunidades com o cenário atual – das políticas às financeiras”. Mais verbas para desenvolvimento local do futebol, mais escudos FIFA a bandeiras de federações menores, mais amistosos da Seleção Brasileira em seus territórios regionais e mais chefes de delegação viajando para a Europa...

Fidelidade, cá entre nós, não é o forte dessa gente.

E quem é Samir Xaud?

Ele é médico, tem 41 anos, e é filho de Zeca Xaud. Seu pai é presidente da Federação de Futebol da Roraima (com 10 times filiados), que está no cargo desde 1980 e terminará o mandato em 2026. A curiosidade é: em 2024, Samir foi eleito novo presidente da Federação de RR, e assumirá o cargo somente em 2027 (ou: assumiria, pois deve estar na CBF).

Lógico, Samir não estará no cargo pelo que já fez ao futebol ou pela meritocracia, mas por ter sido o nome do grupo político que entra.

Esse, simplesmente, é o futebol brasileiro. Tem como dar certo?

Rafael Porcari é professor universitário e ex-árbitro profissional ([email protected])

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